quarta-feira, 15 de maio de 2013

PEC 37 não interfere da atribuição constitucional do MP

15maio2013
FIM DE DISTORÇÕES

PEC 37 garante ao MP poder atribuído pela Constituição

A Proposta de Emenda à Constituição 37 de 2011, apelidada, com inigualável habilidade de marketing, “PEC da impunidade”, não traz uma única linha ou vertente capaz de tolher os poderes originariamente concedidos ao Ministério Público pela própria Constituição Federal. Muito pelo contrário: busca, apenas, acabar com interpretações distorcidas que, a bem da verdade, restringem a atuação ministerial nas investigações criminais, especialmente no que diz respeito às prisões cautelares (temporária e preventiva).
A Constituição vigente é clara ao estabelecer que a segurança pública é atividade exercida de forma ostensiva (pelo combate direto à criminalidade iminente) e pela investigação de crimes já praticados. Esta segunda função, que se desenvolve por intermédio de inquéritos instaurados e presididos por delegados de Polícia, fica a cargo da Polícia Federal e das Polícias Civis (denominadas Polícia Judiciária).
A mesma Carta Constitucional também definiu muito bem as funções do Ministério Público: garantiu sua participação ativa nas investigações criminais ao atribuir-lhe o controle externo da atividade policial, função exclusiva e indispensável ao futuro exercício da Ação Penal. Além disso, permitiu-lhe requisitar instauração de inquéritos policiais e diligências investigatórias a serem realizadas pela Polícia Judiciária (que, por sinal, é obrigada a atender à requisição).
Portanto, o que a PEC 37/2011 busca é apenas manter as funções institucionais nos exatos termos em que foram planejadas pelo nosso poder constituinte originário. E o faz com a seguinte normatização: “a apuração das infrações penais incumbem privativamente às polícias federal e civis”. Nada além disso.
Assim, sem alterar, em uma vírgula sequer, os poderes investigatórios já atribuídos ao Ministério Público, a PEC 37/2011, se aprovada, impedirá que este órgão, ao arvorar-se na condição de investigador policial, reduza sua capacidade postulatória especialmente em relação às prisões cautelares.
Isto porque, em tema relacionado às prisões, vigora o princípio da estrita legalidade, que impede qualquer interpretação extensiva ou analógica das regras que restringem a liberdade. Os dispositivos legais que permitem a decretação das prisões temporária e preventiva, por seus turnos, exigem, respectivamente, “inquérito policial” ou “investigação policial” como pressuposto de existência da custódia cautelar sem processo.
Neste sentido é o artigo 1º da Lei 7.960/1989, que permite a prisão temporária desde que imprescindível para as “investigações do inquérito policial”. O artigo 311 do Código de Processo Penal, no mesmo diapasão, admite prisão preventiva “em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal”.
Inquérito policial, porém, é instrumento dotado de formalismo e previsibilidade legal, destinado à reunião de elementos acerca de uma infração penal, o que se faz pelas investigações e diligências realizadas pela Polícia Judiciária — e somente por ela. Não se confunde, jamais, com o autodenominado PIC — Procedimento Investigatório Criminal, desenvolvido diretamente pelo Ministério Público. A diferença entre os dois procedimentos é tão clara que a própria Resolução que regulamenta o PIC (13/2006 — CNMP) estabelece que o Ministério Público, ao término de sua investigação direta, requisite a instauração de inquérito policial (artigo 2º, inciso V). Mais: enquanto, por imposição constitucional e processual, o inquérito policial é submetido ao controle do Ministério Público, o PIC é procedimento descontrolado.
Por fim, mesmo com a aprovação da PEC 37/2011, o Ministério Público continuará a promover, diretamente, investigações para proteger o patrimônio público e social, o meio ambiente e outros interesses difusos e coletivos. E, se em tais investigações, destinadas inicialmente a subsidiar Ação Civil Pública, o Ministério Público constatar algum indício de crime, ele poderá requisitar a instauração de inquérito policial ou oferecer denúncia, oportunidade em que se legitima a representar pela decretação de prisão cautelar.
Diante disto, sofisma quem apelida a PEC 37/2011 de “PEC da impunidade”. Muito pelo contrário: sua aprovação garantirá, ao Ministério Público, todos os poderes investigatórios que lhe foram originariamente atribuídos pela Constituição de 1988 sem qualquer diminuição e, acima de tudo, em absoluto respeito ao Estado Democrático de Direito.
Carlos Kauffmann é advogado criminalista, conselheiro da OAB-SP, Professor de Processo Penal da PUC-SP e membro da Comissão de Defesa da Constitucionalidade das Investigações Criminais da OAB-SP.

terça-feira, 14 de maio de 2013

Ministério Público não tem poder de investigação”, diz presidente da OAB-SP


POLÍTICA
 
Publicado Sexta-Feira, 10 de Maio de 2013, às 07:26
 
Para Marcos da Costa, o órgão tem a atribuição de acusar, que é diferente de investigar
O Ministério Público não tem a atribuição de investigar e quando toma esta iniciativa pode até prejudicar o inquérito criminal. A opinião é do presidente da Ordem dos Advogados (OAB) de São Paulo, Marcos da Costa. Em entrevista ao Brasil Econômico, o advogado tributarista disse que a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 37, que limita o poder de investigação do Ministério Público, e está em discussão no Congresso Nacional, “reitera a ausência de poderes de investigações criminais por parte do órgão”. O tema, inclusive, será debatido nesta quinta-feira (9) pela OAB de São Paulo.
 
O projeto que tira poder de investigação do Ministério Público, em discussão em Brasília, não vai enfraquecer as ações órgão?
 
Na verdade, o entendimento que nós temos é que hoje o Ministério Público não tem poder de investigação penal. Não tem. A PEC 37 neste ponto seria desnecessária. O que acontece é que o próprio Ministério Público, apesar de não ter, funcionalmente, estes poderes, passou a promover algumas investigações e isso levou a um questionamento em ações que foram propostas com base em investigação do órgão. Por conta deste questionamento, há um debate no Supremo (Tribunal Federal). O que vai significar inclusive que se o Supremo entender que realmente o MP não tem poderes de investigação, as ações que estão aí há muito tempo poderão ser prejudicas, porque houve uma coleta ilegal de provas.Em função do questionamento, surge a PEC, que vem reiterar ou deixar mais clara a ausência de poderes de investigações criminais por parte do MP.
 
Então o MP investiga sem poder investigar?
 
Hoje, do ponto de vista criminal, a competência é exclusiva da Polícia Judiciária, ou da Polícia Federal, dependendo do tipo de delito que está se apurando.
 
Então o MP faz investigações ilegais?
 
Do ponto de vista criminal, as investigações não têm base funcional, nem legal. Apesar disso, o Ministério Público tem feito investigações. Com essas investigações o MP depois dá entrada em ações penais. Na ação penal é questionado o período de investigação, as investigações e as provas que foram colhidas, porque se houver o entendimento, e creio que deva acontecer, de que o MP não tinha poderes para fazê-lo, as provas serão consideradas ilegais. E declarando a ilegalidade da prova há prejuízo, acaba prejudicando a própria ação penal. Por isso vem a PEC 37. Ela vem para reforçar a ausência de poderes de investigação do MP.
 
Isso não vai favorecer a impunidade?
 
Ao contrário. O Estado é único. Quando acabou o totalitarismo foram divididas as funções do Estado, por ele próprio. Então, no caso da Justiça, a investigação criminal fica a cargo da polícia. A acusação a cargo do Ministério Público. O julgamento a cargo do Magistrado.
 
Como é que o MP vai acusar?
 
Com base na investigação da polícia. A polícia investiga. Quem tem o controle externo da polícia é o Ministério Público. E os inquéritos policiais são encaminhados ao próprio MP. A cada 30 dias o órgão recebe o inquérito policial. Para verificar, inclusive, se as diligências estão sendo bem realizadas. Então o comando do sistema está nas mãos do MP, controlando a atividade policial. Ele não precisa promover a investigação direta. Há tempos atrás o MP também quis atribuir a si parcelas do próprio poder Judiciário. O MP pretendeu ter, por exemplo, poderes para decretar prisão preventiva. O que se entendeu que não era possível, pois esta é uma atribuição própria do Poder Judiciário.
 
Qual a diferença entre a investigação da polícia e a do Ministério Público?
 
A investigação não visa acusar. A investigação não é para acusar. A investigação é para apurar. Chega a denúncia de um fato, a polícia passa a investigar se aquele fato ocorreu e quem foi o autor daquele fato. Ela não vai acusar. Se ela ao concluir o inquérito entender que não houve o fato, ou que o fato não foi um fato, ela vai informar isso. Vai para o Magistrado que vai determinar o arquivamento no inquérito.
 
Mas o MP usa alguma brecha constitucional para investigar?
 
Não tem brecha constitucional. O Ministério Público passa a construir uma tese jurídica, não por conta de uma brecha constitucional, mas de quem pode mais pode menos. Tanto eu posso acusar como eu posso investigar também. Mas não é o que diz a Constituição.
 
O sr. acha que os promotores do MP tentam se promover e muitas vezes e ocorrem desvios?
 
Eu acho só que é diferente da polícia, que apura fatos. Se você comparecer na polícia e denunciar o roubo de uma bicicleta, ela tem que apurar. Se for uma denúncia de uma fraude, de qualquer natureza, a polícia tem o dever de investigar. Se você denunciar um ato de corrupção a polícia tem a obrigação de investigar. O MP não faz isso. O MP escolhe a dedo quais são as situações que ele quer investigar.
 
O MP é partidarizado?
 
Eu não diria que ele é partidarizado. É uma instituição forte, que precisa ser destacada, ser mantida com essas atribuições que ela tem hoje. Mas que até para valorizar seu trabalho ela não pode passar a ter atividades fora das suas atribuições, pois acabaria desfavorecendo funções elevadas que o MP tem hoje.
 
Mas o sr. acha que algumas vezes o MP é usado politicamente?
 
Não acho. Acho que o MP é uma instituição absolutamente autônoma. E assim tem que ser.
 
Então na opinião da OAB o MP não tem que investigar?
 
Não tenho dúvida nenhuma sobre isso. Por diversas razões. Uma delas é porque a investigação é neutra e o Ministério Público não é neutro. O MP é o órgão de acusação. Quando o MP investiga, ele investiga para acusar. Quando a polícia investiga, investiga para apurar. Ela é neutra. Aquelas provas que a polícia conseguiu constituir vão para o processo. Favoreçam a acusação ou favoreçam a defesa. O MP tem um viés de acusação. Portanto, a possibilidade de nessa apuração surgir provas que favoreçam a defesa, essa possibilidade não existe. Porque não é a função do MP. Outro ponto, é que o inquérito policial tem um procedimento formal com disciplina legas. O inquérito tem que ter razão para começar. E há um prazo que a lei define para ele encerrar e se eventualmente a investigação naquele prazo não estiver concluída, a autoridade policial tem que pedir para o juiz a extensão do prazo…. A investigação para o MP não tem nada disso. Ele começa e não tem prazo para terminar. Não se controla as atividades do MP. Não se sabe o que ele está investigando.
 
A conclusão é que a investigação do MP em vez de ser complementar acaba atrapalhando a Justiça?
 
Sim. É um outro problema que vem nesta linha que é a questão da paridade de armas. A Justiça acontece se tiver igualdade de condições de acusação e de defesa. Se a acusação não tiver as mesmas armas da defesa, a Justiça não vai ser bem feita. Se a defesa não tiver as mesmas armas da acusação, a Justiça não vai ser bem feita.
 
Na sua opinião, quais os principais problemas do sistema investigativo no Brasil?
 
Eu acho que precisa de mais investimentos. Nós temos uma polícia em termos profissionais qualificada, mas sem estrutura, como, por exemplo, no instituto de criminalística. Muitas vezes leva um ano para um laudo ser concretizado. Precisa investir também no Ministério Público, no poder Judiciário. Precisa de gestão melhor também.
As pessoas ficam muito impressionadas e não entendem o motivo de tanta demora para se julgar alguns casos, como do Carandiru e do PC Farias…
Um processo demora muito. No caso do Carandiru, do PC Faria, e outros tantos, isso ocorre por falta de estrutura adequada para suportar a demanda existente. O caso Carandiru demorou, por exemplo, por problema de laudo, realização das perícias, que, aliás, teriam sido comprometidas. Demorou também por ter muitos réus, por não ter estrutura no Poder Judiciário. O Judiciário é um dos poderes que ampliou muito seu leque desde a Constituição de 1988. Nós temos um novo código civil. Temos o surgimento do Código do Consumidor, do Estatuto da Criança, do Estatuto do Idoso. Temos a reformulação da base jurídica do Brasil. Temos uma facilitação de acesso à Justiça. Hoje, a Justiça é mais fácil de ser acessada pelo cidadão do que era antes da Constituição de 1988, até porque o cidadão passa a ter mais consciência dos direitos. Mas não se deu estrutura ao Poder Judiciário para dar conta desta demanda que surgiu.
 
O Poder Judiciário está sucateado?
 
Completamente. O Poder Judiciário não tem recebido a atenção que ele mereceria. Eu digo o Poder Judiciário estadual, onde tramitam estes processos. Uma comparação com a Justiça do Trabalho, que recebeu nos últimos anos um volume adequado de investimentos e hoje um processo na Justiça do Trabalho demora muito menos tempo do que demorava há alguns anos. Então, fundamentalmente, é investimento e gestão. Além de ter pouco investimento, a melhor gestão deste pouco investimento que chega. O problema começa, no caso criminal, na delegacia de polícia, com o aparelhamento da polícia judiciária. A demora começa desde lá. Em São Paulo chegamos a ter 30 mil processos por juiz. Nós temos mais de 300 varas criadas nos últimos 10 anos. Uma criação de uma vara é o reconhecimento de que precisa de mais juiz naquele local. O próprio MP sofre disso e não tem orçamento adequado para suas atribuições.
 
O sr. acha que deveriam aumentar o número de tribunais?
 
Agora inclusive estamos com a situação da Justiça Federal. Quatro Tribunais Regionais Federais foram criados e a discussão agora é sobre a sua instalação. Como é que se quer uma Justiça mais rápida se não dá estrutura para ela’
 
Sobre a crise dos poderes. Por um lado temos o STF reclamando de ingerência do legislativo, e, por outro, o Legislativo reclamando, dizendo que o Supremo se intrometeu na questão da criação de partidos. Quem tem razão?
 
A discussão é natural para uma democracia ainda recente, onde os poderes ainda estão firmando as suas atribuições. No Brasil, quem mais legisla não é o Legislativo, é o Executivo. Quem pauta o Congresso é o Executivo com as Medidas Provisórias. Esse volume de MPs também é culpa do próprio Legislativo que aceitou que isso acontecesse. O Legislativo por sua vez, por conta desse volume de MPs, não legisla sobre assuntos que seriam essenciais, que vão parar na Justiça, tendo lei ou não tendo lei. Na Justiça, o Judiciário tem que decidir e se não tiver lei ele vai buscar outros princípios para julgar. Quando ele busca outros critérios, ele passa a legislar para tomar uma decisão sobre um tema que tem uma lacuna legal. Isso tudo permite que esse tipo de situação aconteça.
 
E no caso de um impasse, a solução seria intervenção militar, como defendeu o presidente do Senado, Renan Calheiros?
 
Não. De forma alguma. Acho o momento natural para uma democracia ainda incipiente. As próprias estruturas estão definindo seus espaços.
 
Qual a posição da OAB, na questão entre a PEC 33, que submete ao Congresso decisões do STF?
 
A PEC 33 quando tenta fazer com que decisões do Judiciário passem a ter uma necessidade de aprovação pelo Congresso Nacional é um disparate. Não há de se fazer isso.
 
E quanto a intervenção do STF no projeto que restringe a criação de partidos?
 
Também acho um equívoco. Acho que tem que deixar tramitar o projeto lei. É um direito dos parlamentares debater. O parlamentar que é contra o projeto tem o direito de se manifestar. O projeto não necessariamente vai ser aprovado. E ser for aprovado, não significa que será aprovado como ele nasceu.

PEC DA LEGALIDADE

Ministério Público quer escolher o que e quem investigar
 
 
Luiz Flávio Borges D'Urso é advogado criminalista, Mestre e Doutor em Direito Penal pela USP, foi presidente da OAB-SP por três mandatos.
 
Esse tema, na verdade, foi ao longo do tempo, completamente desvirtuado. É preciso esclarecer a opinião pública que, lamentavelmente, diante de informações falaciosas, equivocadas, vem fazendo juízo de valor sobre esse tema, com premissas, muitas delas falsas, e consequentemente equivocando-se nas suas conclusões.
 
Vejo manifestações de pessoas que têm responsabilidade na nossa sociedade, formadores de opinião e que opinam, formando opinião de muitos, mas sequer conhecendo do que estão tratando, sobre o que estão opinando e esta campanha que se fez contra a PEC 37 tem um fundamento, tem uma razão de ser e é sobre isso que eu quero falar. Mas não sem antes registrar que o Ministério Público, tanto estadual quanto federal, instituições que tanto respeitamos, são indispensáveis para a manutenção do Estado Democrático de Direito, instituições fundamentais para que possamos construir a Justiça. Instituições que, como a magistratura, como a advocacia, como as demais instituições, são colunas de sustentação de nossa Democracia e têm suas atribuições estabelecidas e limitadas em lei e a observância desses limites é que faz o Estado de Direito.
 
E a PEC 37 precisaria existir? Jamais. Nós não precisamos de emenda constitucional para dizer o que já está dito. Sobre a PEC 37, vejo tanta gente falando e eu pergunto se já leram o texto da proposta e me respondem que ainda não, mas que leram o que foi publicado pela imprensa. Mas o que saiu na mídia foi distorcido. As fontes para alimentar a mídia, muitas vezes, foram falaciosas. Assim sendo, a PEC 37 acrescenta mais um parágrafo, o décimo, ao Artigo 144 da Constituição Federal, o qual fala sobre segurança pública e estabelece, no parágrafo 1º, atribuição à Polícia Federal para apurar crimes de competência federal e no parágrafo 4º às Polícias Civis, ambas são dirigidas por delegados de polícia de carreira incumbindo-as, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária, que consiste na apuração de infrações penais, exceto as militares.
 
Basta ler para saber o que o legislador quis. Compete às polícias civis a apuração das infrações penais. Então quando nós lemos a Constituição Federal, nós não temos qualquer dúvida sobre o que pretendeu o legislador. Para o Ministério Público ele também foi claro e deu a atribuição da titularidade da Ação Penal e também a fiscalização da atividade realizada pela polícia judiciária. Isso está muito claro na Constituição. Nunca, em momento algum o constituinte autorizou o Ministério Público investigar diretamente infrações penais, o que se realizado consideramos flagrantemente ilegal.
 
Em um determinado momento histórico passou-se, em razão da possibilidade de o MP realizar o inquérito civil, expedir notificação para constituir prova em um inquérito civil (jamais criminal), estendeu-se esse entendimento e o próprio MP passou a advogar a tese de que, podendo constituir elementos de prova para o inquérito civil, poderia também fazê-lo para o inquérito criminal, e tentou o MP construir, pinçando pedacinhos de uma lei, mais um trecho de artigo doutrinário, além de regras criadas interna corporis, mais uma consideração acola, mais um julgado que não tem nada a ver com o tema central, formando uma verdadeira colcha de retalhos, tentou construir uma tese de uma atribuição de poderes de investigação criminal, que até hoje não tem solidez.
 
Não foi o legislador, em momento nenhum, que deu atribuição ao MP para realizar investigação criminal. Reiteramos jamais isso aconteceu. O legislador foi muito claro no que pretendia. Portanto, entre ficar com a construção da colcha de retalhos para uma tese que é muito frágil e uma leitura objetiva, clara, precisa do que quer o legislador, nós não temos opção. Intérprete da lei tem a obrigação de entender o texto como ele foi proposto, votado e sancionado, especialmente quando esse texto é o da Carta Magna. Assim sendo, está claro na Constituição Federal, sem deixar qualquer espaço para outra interpretação: o MP não pode realizar diretamente investigação criminal, isso compete à Polícia Judiciária.
 
Então, a premissa é essa. O MP não tem poder para investigar crimes. Tudo o que vem depois é distorção, é falácia, é equívoco. Há quem diga que a PEC 37 vai retirar poderes do MP. Ora, ninguém retira o que o outro não tem. Isto está errado. O MP não tem poderes, portanto não se pode retirar dele o que ele não tem. A PEC vai limitar os poderes de investigação do MP. Não se pode limitar o que alguém não tem.
 
Assim sendo, esta construção da tese do MP passou a ter algumas bases curiosas e outras perigosas. A construção da tese da investigação pelo MP ganhou um destaque maior com a realização de grandes operações feitas no Brasil pelas polícias civis estaduais e federal e com a participação do MP nessas operações. E esta articulação da tese veio em razão da prática ilegal de investigação criminal com coleta de algumas provas que foram sendo colhidas sem conhecimento da autoridade policial. Provas essas que possivelmente não chegavam a ser incluídas em inquérito policial. A partir daí o MP passou a realizar procedimentos investigatórios de maneira autônoma, inclusive criando regras internas para tal, o que jamais supre a vedação legal.
 
Quero lembrar que, já que não temos lei que autorize o MP a investigar, sustentam alguns que a mudança legislativa com tal previsão autorizadora resolveria o problema. Pergunto: é possível isso? É adequado para o Brasil? Não é. E por que não é? Porque precisamos de divisões e limitações para controlar o Estado. Montesquieu, para fazer com que um Estado todo poderoso, absolutista, pudesse ser controlado, dividiu esse Estado em três partes. A tripartição dos poderes do Estado, no Legislativo, Executivo e Judiciário, foi uma forma direta e indireta de autocontrole do próprio Estado. Assim sendo, o fracionamento do Estado divide responsabilidades e atribuições, e isso tem por razão o autocontrole. Não se pode super-fortalecer uma parte do Estado em detrimento de outra.
 
Da mesma maneira quando olhamos o espectro da apuração criminal no Brasil, nós vemos que o Estado, quando avoca para si a investigação criminal, a iniciativa da ação penal e a punição criminal, o faz pensando na necessidade do controle da atividade do próprio Estado, dividindo essas atribuições entre as partes do Estado, estabelecendo limites de atuação e o equilíbrio com o cidadão.
 
Então o Estado investe de autoridade pessoas preparadas, com formação jurídica, as quais compõem a polícia judiciária. Essa polícia é um pedaço do Estado com atribuições específicas de investigar crimes e não de promover a ação penal, nem tampouco de julgar. A polícia, para exercer essa atribuição específica de investigar, é preparada para isso, é formada para isso. E aqueles que ingressam nessa carreira, mediante concurso público, são vocacionados para isso. Nesse espectro citado, ao término da investigação realizada pela polícia judiciária, com a atribuição do MP de fiscalizar essa atividade investigativa, jamais de realizá-la diretamente, o MP recebe o resultado da investigação para fazer o seu juízo de valor e promover a competente Ação Penal, atribuição exclusiva que lhe é conferida pela lei.
 
Quando se argumenta que a polícia, em alguns casos não consegue investigar adequadamente, considerando que o MP tem a obrigação de fiscalizar o trabalho da polícia, se conclui que também o MP não fiscalizou como devia. Se houve omissão da polícia, houve também do MP. Ora, se existem problemas e deficiências de ordem material ou financeira, que o Estado supra essas necessidades, para que a polícia cumpra seu papel constitucional.
 
De modo que de tudo que se tem falado em relação às limitações e fragilidades que a polícia possa ter, todas as afirmações são passíveis de solução. Basta que o Estado as promova. E quando se tenta dizer que há uma banda podre na polícia, que há corrupção, eu quero lembrar que isso não é privilégio de nenhuma instituição, porque todas elas formadas por homens, têm as mazelas e as vicissitudes das fraquezas e desvios de comportamento do ser humano. O que precisamos é reagir a isso. Se tivermos uma situação de corrupção, de desvio de comportamento dentro da instituição, há a possibilidade de reagir e extirpar aquilo que trouxe o desvio de comportamento. Assim a função fiscalizatória do MP sobre a polícia precisa ser realizada a contento e não o MP realizar tarefa para a qual não é incumbido pela lei.
 
Assim sendo, toda essa discussão que se construiu nessa base falsa de que o MP tem poderes para investigar é uma construção de uma colcha de retalhos de uma tese absolutamente frágil e falaciosa. Construiu-se essa tese que não se sustenta no plano legal. Dessa forma, no plano da conveniência social, pode o MP investigar diante dessa divisão que o sistema estabeleceu? Não pode. Não se deve admitir nem a possibilidade da mudança da lei para lhe conferir tal atribuição investigativa criminal pois essa subverteria o próprio sistema. Ainda se questionaria: Se o MP pudesse investigar crimes, por que a defesa também não poderia?
 
Vejo argumentos sustentados por autoridades que defendem esses supostos poderes do MP para dizer que quem pode mais pode menos. Se o promotor pode promover a ação penal, não poderia ele investigar? Claro que não, e respondo ainda com outra pergunta: se o juiz pode decidir e até condenar, não poderia ele investigar e promover a ação penal? Não, porque as atribuições de cada um são muito claras, precisas e a lei as estabelece de maneira a haver a complementação das atividades, além do controle da própria atividade estatal.
 
Quando a autoridade policial tem conhecimento de um fato definido como crime, deve proceder à investigação indistintamente sob pena de prevaricação. Quando o MP sustenta que hoje poderia investigar ou que no futuro poderá investigar, com uma mudança legislativa, o MP deixa claro que não quer esse ônus de realizar todas investigações que tiver conhecimento, indistintamente. O MP quer escolher, quer eleger, quer selecionar o que e quem investigar. Com quais critérios? Isso não é republicano.
 
Pior que isso é esse regramento interna corporis, que não pode se sobrepor à Constituição, que não é lei, mas regras internas que estabelecem esse tal de PIC, que é um Procedimento de Investigação Criminal realizado pelo MP, que não tem base legal, que ninguém sabe como funciona a rigor, no qual são produzidas provas sem controle e fiscalização de outro órgão e destituído do controle jurisdicional. Provas colhidas no gabinete de um integrante do MP. Isso milita em desfavor dos primados constitucionais da ampla defesa, do contraditório e do devido processo legal porque quando a autoridade policial coleta provas na investigação, ela tem obrigação de enfeixá-las num instrumento previsto em lei, que é o inquérito policial para que o investigado tenha conhecimento do que o Estado tem contra ele. Mais do que isso, para que haja controle jurisdicional sobre essa atividade. Então, quando a polícia investiga, o MP tem a obrigação de fiscalizar e há controle jurisdicional sobre essa investigação, a ponto de aquele que está sendo investigado sem justa causa poder trancar a investigação imprópria, sendo socorrido por esse controle do juiz.
 
Este sistema é aberto, transparente, protege a cidadania e os interesses maiores da Justiça. E o que vemos quando o MP defende a sua investigação? A ausência de um local onde se depositam as provas. Um depoimento colhido no MP, por exemplo, vai ser arquivado onde? Na gaveta de um integrante da instituição e só terá acesso a essa prova o MP e quem mais ele desejar. Estas provas serão utilizadas pelo MP, que é parte, que é o acusador? Se for para corroborar a acusação, certamente. Caso contrário, poderá não ser utilizada, pois o MP não tem o compromisso com a imparcialidade, sendo parte nessa relação dialética do processo. A regra é de que quem investiga não pode ser o mesmo que acusa, e quem julga, não investiga, nem tampouco acusa.
 
Toda essa confusão de conceitos e informações distorcidas levadas à opinião pública se antagoniza com os princípios constitucionais de garantias da cidadania. A PEC 37 está sendo chamada pelo MP de PEC da impunidade, da corrupção, da ilegalidade. Na verdade essa PEC 37 é a PEC da legalidade, porque ela reprisa o que já está na lei. E esse discurso quando se diz que, se o MP não investigar, não tem investigação ou que haverá impunidade ou haverá corrupção, é perigoso, pois coloca o MP como um quarto poder que só a ele, com ele e por ele é que se combate corrupção e a impunidade. Esse senso absolutista é perigoso para a cidadania, pois o MP é uma instituição que apresenta as mesmas virtudes e pecados das demais instituições republicanas, nem mais, nem menos.
 
O sistema da persecução criminal, esse espectro é razoável e funciona adequadamente se não houver invasão de atribuições. Por fim lembro que o texto constitucional não diz que a investigação cabe à polícia exclusivamente, diz privativamente, por isso Coaf, a CVM, a CPI e outros vão continuar a coletar provas, elementos e informações, destinadas ao inquérito policial, presidido pelo delegado de Polícia e fiscalizado pelo MP.
 
Diante da campanha nacional patrocinada pelo MP contra a PEC 37, precisamos esclarecer a nação e ter articulação necessária para levar nossa posição favorável à PEC 37 à toda a sociedade, esclarecendo-a. Sabemos da importância da PEC 37, embora desnecessária. Nesse momento é preciso dizer o óbvio. Não podemos agigantar um poder, uma instituição em detrimento das demais sob pena de não se poder mais controlá-la. Para o bem do Ministério Público, das demais instituições e do Brasil, temos de lutar pela aprovação da PEC 37, A PEC da legalidade.
 
Revista Consultor Jurídico, 11 de maio de 2013

quarta-feira, 8 de maio de 2013

Discurso do Dep Fed Lourival Mendes Autor da PEC 37

O SR. LOURIVAL MENDES (Bloco/PTdoB-MA. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, ocupo a tribuna nesta tarde para manifestar-me a respeito da PEC 37, a PEC da Legalidade. Muito se tem discutido sobre a PEC 37, de minha autoria. Alguns opositores insistem em patrocinar uma campanha em setores da mídia tentando macular os reais propósitos dessa proposta de emenda constitucional.Com todo o respeito, a superficialidade leva a conclusões apressadas. Se me permitem, gostaria de mencionar alguns argumentos.
Entre as instituições que concordam com a impossibilidade de o Ministério Público investigar, ou seja, apoiam a PEC 37, estão a Ordem dos Advogados do Brasil, a Advocacia-Geral da União, a Defensoria Pública do Brasil, a Polícia Federal, a Polícia Civil. Quem discorda é o Ministério Público.
A Ordem dos Advogados do Brasil é autora da Ação Direta de Inconstitucionalidade ADIN nº 4.220, Deputado Mauro Benevides, que pretende deixar claro que o texto constitucional não permitiu que o Ministério Público investigasse.
Da mesma maneira, Deputado Luiz Couto, manifestou-se a Advocacia-Geral da União, renomados juristas como os constitucionalistas Ives Gandra da Silva Martins e José Afonso da Silva, dentre outros. Os desembargadores Edson Smaniotto, Alberto José Tavares da Silva e Tourinho Neto já se declararam em diversos momentos favoráveis à PEC nº 37.
Na mesma linha, Sr. Presidente, as OABs seccionais do Distrito Federal, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Pará, Sergipe e São Paulo se manifestaram favoráveis à PEC da legalidade. Deve ser dito ainda, Sr. Presidente que a OAB/SP não somente se manifestou favorável à PEC nº 37 mas foi além, criando uma comissão de notáveis criminalistas para defender a PEC da legalidade, o estado democrático de direito.
Desse modo, prezados senhores, fica a seguinte pergunta: será que toda a comunidade jurídica do nosso País estaria errada e somente o órgão acusador estaria certo?
O próprio Dr. Eugênio Aragão, membro do Ministério Público Federal, Corregedor-Geral do Ministério Público do Brasil, numa autocrítica sincera e preocupada com o rumo da instituição, afirmou que ao agir de forma justiceira, descoordenada e politizada, o Ministério Público arrisca a posição constitucional.
Observa ainda que o Ministério Público não percebeu, mas o fato é que sua imagem vem se desgastando ao longo do tempo em importantes setores do Estado e até da sociedade. Estas palavras, Sr. Presidente, Deputado Izalci, é do membro, do Corregedor-Geral do Ministério Público do Brasil.
A propósito, ainda destaca o nobre Corregedor-Geral do Ministério Público Federal, Dr. Eugênio Aragão, que, a partir de 1988, o Ministério Público — palavras dele — deixa de agir como um parceiro do Estado e passa a comportar-se como seu sensor. Nesse sentido, o Ministério Público vem abrindo trincheiras contra governos, instituições e categorias profissionais, tornando-se um importante desagregador da governabilidade.
Não se está aqui dizendo que as funções do Ministério Público não são importantes, mas que este órgão deve se preocupar com o que lhe foi atribuído pela Constituição Federal, pelo constituinte orginário.
Na Constituinte de 1988, foram feitas sete emendas com a finalidade de inserir as investigações criminais, no art. 129, ao Ministério Público. Todas as sete foram rejeitadas pelos Constituintes de 1988. Depois da promulgação, duas tentavivas de emendas foram feitas, mas ambas foram rechaçadas pelo Congresso, por esta Casa, por este Parlamento, vedando, proibindo, não permitindo que o Ministério Público brasileiropromovesse investigação.
A discussão, Sr. Presidente, passa por juízo de igualdade das partes no processo.
Há, na gênese do processo, um princípio denominado paridade de armas, ou seja, as partes têm de ter igualdade de meios e oportunidades durante o processo. Num processo justo, tanto a defesa quanto a acusação têm as mesmas chances de acusar e defender.
Investigar, Sr. Presidente, é produzir provas; investigar é levantar dados e informações inerentes a um crime. Se uma das partes do processo (parte acusatória) puder produzir as provas, e a parte adversa (no caso, a defesa) não tiver essa oportunidade, então quebramos a paridade de armas no processo. A igualdade do Direito no Brasil, Sr. Presidente, requer a separação da função de investigar.
Quem irá produzir as provas a serem levadas à análise do juiz? E a função de acusar do Ministério Público, a função de defender da Advocacia Pública ou privada e da Defensoria Pública e a função de julgar da Magistratura?
Se a parte acusatória for quem produz as provas, logicamente serão produzidas as provas que interessam à acusação com vistas à condenação. A defesa ficará prejudicada. Quem garante que o órgão acusador irá se preocupar com as provas de defesa?
A Polícia, por sua vez, não é acusação nem defesa. Ela atua numa fase antecedente ao processo, que é o inquérito policial, e produz as provas a serem levadas a juízo, provas a serem contraditadas pela acusação e pela defesa durante o processo, provas a serem analisadas pelo juiz, dotado de imparcialidade.
Permitir que o MP investigue seria criar uma superposição da acusação em relação àdefesa. Seria quebrar a paridade de armas e negar a existência de um processo baseado em princípios democráticos, assegurado o princípio da ampla defesa.
Sem dúvida alguma, Sr. Presidente, é importante que o Brasil evolua e atinja um grau de moralidade pública, ninguém é a favor da corrupção, notadamente um delegado de polícia. Todavia, para chegarmos a esse estágio não podemos macular o processo, desrespeitar garantias constitucionais e instalarmos um Estado acusador ou Estado do terror.
Devemos nos lembrar de que uma das primeiras preocupações de um regime não democrático é orientar e direcionar o aparelho policial para a acusação. Em sentido contrário, a principal garantia de uma democracia é a separação e o distanciamento da polícia judiciária do órgão acusador. Se tivermos nossas polícias judiciárias servindo aos interesses da acusação, significa dizer que teremos todo o Estado trabalhando para condenar pessoas, sem poder oferecer a elas direito à defesa.
As polícias judiciárias têm a função de esclarecer os fatos, conforme determina a Constituição Federal em seu art. 144. Cabe a elas produzir as provas a serem posteriormente ofertadas às partes — acusação e defesa —, a fim de defenderem seus legítimos interesses, e ao juízo para que possa prolatar sua decisão final.
Por esse motivo o trabalho da polícia judiciária tem de ser conduzido com isenção e imparcialidade. O Ministério Público é parte do processo. Por isso, é de sua natureza agir com parcialidade. Não cabe a ele produzir provas. E ilegítimo que investigue. É um desequilíbrio jurídico entre as partes.
Não podemos nos esquecer de que a grande maioria dos inquéritos serve também para a defesa.
É comum ouvir críticas ao inquérito policial dizendo que há um grande número de inquéritos que são arquivados sem denúncia. Esta, Sr. Presidente, é a maior prova de que nosso sistema está correto, pois o inquérito policial não se destina a acusar pessoas. A finalidade do inquérito e da Polícia Judiciária é colher e demonstrar os fatos. O resultado do apurado, investigado e reconstituído poderá ser de que houve ou não crime. A conclusão pode ser que houve um crime, mas em legítima defesa, ou que o fato aconteceu dentro das condições de excludente de criminalidade ou de culpabilidade, como é o caso dos acidentes.
A advocacia também se vale, Sr. Presidente, dos elementos colhidos e contidos nos inquéritos policiais para formular suas teses de defesa. E como seria um sistema no qual o Ministério Público investigou e se preocupou em inventariar unicamente as provas de acusação?
Por isso é que tanto a OAB do Brasil, a Defensoria, a AGU, assim como as polícias defendem que a investigação seja feita por policiais, em atendimento aos preceitos da Constituição Federal.
As polícias não são parte no processo, atuam numa etapa antecedente. Sofrem, é verdade, o controle externo do Ministério Público, mas não trabalham para a acusação, não são subordinadas àacusação ou à defesa. Todos esses órgãos, tanto a acusação quanto a defesa, podem pedir diligências, solicitar a requisição de novas períciase acompanhar todo o processo. A Polícia Judiciária, portanto, não é parte. E é justamente por isso que o Ministério Público luta, faz algumas décadas, para que a polícia seja subordinada a ele, pois tendo o controle sobre a força de trabalho e os meios de produção, parafraseando Marx, terá, então, domínio sobre todo o processo, conseguindo o resultado que bem lhe couber, não se importando se os fins justificam os meios.
O grande prejudicado com uma eventual autorização constitucional ou legal para que o Ministério Público investigue é justamente o indivíduo. O cidadão é que sofrerá, Deputado Mauro Benevides, as consequências. A defesa do cidadão é que ficarásem ter elementos para defendê-lo. No atual sistema, a polícia judiciária coleta todos os elementos e os registra dentro do inquérito policial, o qual pode ser auditado e controlado tanto pelo Ministério Público, como pelo defensor do acusado ou pela Defensoria Pública. Foi justamente nessa orientação ideológica que os Parlamentares que participaram da Constituinte de 1988 não permitiram que o Ministério Público investigasse. Todavia, o que se tem visto é o Ministério Público instaurando procedimentos investigativos sob os mais diversos argumentos. Nesse afã, o Ministério Público criou uma linha argumentativa de que a Constituição Federal de 1988 lhe outorgaria esse poder. Daí a necessidade, Sr. Presidente, da PEC 37, para reafirmar a intenção do constituinte de separar as funções de Estado e manter o atual processo democrático, respeitando-se a paridade entre a acusação e a defesa.
Não se trata de falar de uma preocupação das polícias judiciárias em defender sua função constitucional, mas de resguardar a rigidez das funções do Estado e do sistema processual penal brasileiro. Por esse motivo a PEC 37 foi batizada de PEC da Legalidade, a PEC do Cidadão, a PEC dos Direitos e Garantias Individuais do Cidadão.
Se não bastassem tais argumentos, gostaria de frisar que, em homenagem ao princípio da eficiência, inserido no art. 37 da Carta Magna, cabe a cada ente estatal desempenhar uma única missão. Não há razões plausíveis para dizer que a mesma função caberia a duas ou mais instituições públicas.
Isso poderia resultar em retrabalho ou duplicidade de trabalho com dispêndio de dinheiro público. Exemplo, a condução da economia cabe ao Ministério da Fazenda. Seria ilógico se o Governo resolvesse criar, dentro do Ministério da Saúde, uma estrutura paralela para estudar a condução da economia nacional.
Ora, a máquina pública é regida pelos princípios da eficiência, economicidade e legalidade. Na situação em tela, teríamos a duplicidade de gasto com o dinheiro público, duplicidade de funções e um resultado pouco eficiente.
Não me parece sensato um sistema que autorize o Ministério Públicoa usurpar a função da Polícia Judiciária de investigar, que privilegie a acusação em detrimento da defesa e que permita funções sobrepostas, gastando em duplicidade o dinheiro público.
Por fim, cabe-nos, Sr. Presidente, mencionar que a sociedade brasileira assiste com expectativa a que esta Casa supere as dificuldades desses momentos históricos e democráticos. Foi com muita dificuldade que consolidamos e balizamos o atual processo democrático.
Sr. Presidente, se passar nesta Casa o direito da investigação pelo Ministério Público das infrações penais, fica a pergunta: qual será a próxima ditadura no nosso País.
Ao olhar para o painel, Sr. Presidente, vi aquele crucifixo ali, que está por trás de V.Exa., e me lembrei de que há tempos o Ministério Público tentou tirá-lo deste plenário e também do Senado. A insensatez estáde tal monta que o Ministério Público Federal intentou uma ação para tirar a frase Deus seja louvado da cédula brasileira.
Sabemos que vivemos em um País laico, mas o Ministério Público briga com o delegado, o procurador, o defensor, o advogado, a Magistratura, que vê, quer brigar até com Deus que não vê.
É difícil entendermos essa situação, em um país democrático, sem observamos o princípio do art. 5º da Constituição Federal, que assegura ao cidadão direitos e garantias individuais.
O Ministério Público é uma instituição importante para o nosso País. Pode muito, é verdade. Pode requisitar diligências; pode pedir abertura de inquérito policial; pode pedir novas perícias. Tem um controle externo da polícia judiciária do Brasil. É verdade? É. Que continue assim. Mas não pode investigar. O Constituinte não o autorizou, não outorgou a ele, não deu ele o poder de investigar. O verbo investigar é uma coisa; o verbo controlar é outra; o verbo acompanhar é outra.
Quem pode mais, não pode menos. Essa premissa, Deputado Fernando Ferro, não é verdadeira. Se fosse assim, quem pode mais ou quem pode menos: o juiz ou oficial de Justiça? Com todo respeito que temos aos oficiais de justiça de nosso Brasil, que prestam relevantes trabalhos a essa Nação, quem pode mais é quem dá a sentença. Se não houver oficial de Justiça, o juiz não pode ir ao local fazer cumprir o mandado. Ele manda publicar o mandado. Mas ele não pode. Ele não tem fé pública.
Então, nem sempre quem pode mais, pode menos. Se fosse assim, a Presidente Dilma Rousseff não precisaria do Congresso Nacional. Quem pode mais?
Então, temos que ver essa situação. O grande problema é a falta de autorização legal, uma lei própria que estabeleça que cabe ao Ministério Público investigar. Na realidade, o Ministério Público tem-se transformado em um órgão seletivo, não investiga crimes, mas pessoas. Quem aparece na mídia?
Isso não pode. Vivemos em um Estado Democrático de Direito e as funções de cada um estão contidas na Constituição Federal. Ao Ministério Público cabe quase dez funções. São tantas que ele não estádando conta de cumprir e ainda vai fazer o que não tem competência legal: investigar. Em nenhum dos dispositivos contidos no art. 129 consta investigar. Subentende-se que não existe isso no Direito Público, se a própria Constituição estabeleceu que uma instituição teria o direito de fazer a investigação.
Sr. Presidente, aproveito a oportunidade para dizer que essa PEC permite ao Brasil rediscutir o atual modelo em nome do cidadão brasileiro.
O SR. LOURIVAL MENDES (Bloco/PTdoB-MA. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, muito se tem discutido sobre a PEC 37/2011, de minha autoria. Alguns opositores insistem em patrocinar uma campanha em setores da mídia tentando macular os reais propósitos dessa proposta de emenda constitucional. Com todo o respeito, a superficialidade leva a conclusões apressadas. Se me permitem, gostaria de mencionar alguns argumentos.
Entre as instituições que concordam com a impossibilidade de o Ministério Público investigar – ou seja, apoiam a PEC 37/2011 –, estão a Ordem dos Advogados do Brasil, a Advocacia-Geral da União, a Defensoria Pública, a Polícia Federal e as polícias civis. Quem discorda é o Ministério Público.
A Ordem dos Advogados do Brasil é autora da ação direta de inconstitucionalidade (Adin nº 4.220) que pretende deixar claro que o texto constitucional não permitiu que o Ministério Público investigasse.
Da mesma maneira, manifestou-se a Advocacia-Geral da União. Renomados juristas como os constitucionalistas Ives Gandra da Silva Martins e José Afonso da Silva, os desembargadores Edson Smaniotto (TJDFT), Alberto JoséTavares Vieira da Silva e Tourinho Neto (TRF 1ª) já se declararam, em diversos momentos, favoráveis à PEC 37/11.
Na mesma linha as OABs do Distrito Federal, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Pará, Sergipe e São Paulo se posicionaram a favor da PEC da legalidade.
Deve ser dito ainda que a OAB de São Paulo não somente se manifestou favorável à PEC 37, mas foi além, criando uma comissão de notáveis criminalistas para defender a PEC da legalidade e o Estado Democrático de Direito.
Desse modo prezados senhores, fica a seguinte pergunta: será que toda uma comunidade jurídica estaria errada e somente o órgão acusador estaria certo?.
O próprio Dr. Eugenio Aragão – Corregedor Geral do Ministério Público Federal, numa autocrítica sincera e preocupada com os rumos da Instituição afirmou que ao agir de forma justiceira, descoordenada e politizada, o Ministério Público arrisca a posição que hoje ocupa no quadro constitucional. Observa ainda que o MP não percebeu, mas o fato é que sua imagem vem se desgastando ao longo do tempo em importantes setores do Estado e até da sociedade.
A propósito, ainda destaca o Corregodor-Geral do MPF que a partir de 1988 o Ministério Público deixa de agir como um parceiro do Estado e passa a comportar-se como seu sensor. Nesse sentido, o MP vem abrindo trincheiras contra governos, instituições e categorias profissionais, tornando-se um importante desagregador da governabilidade.
Não se está aqui dizendo que as funções do Ministério Público não são importantes, mas que este órgão deve se preocupar com o que foi atribuído constitucionalmente.
Este MP desacreditado é que se preocupa em usurpar as funções da Polícia Judiciária e em entrar com ações desarrazoadas, tal como a que pede a retirada da expressão DEUS SEJA LOUVADO das cédulas de real. Ou seja, movimentar a máquina judiciária para questões infrutíferas.
Na constituinte de 1988 foram 7 emendas rejeitadas e 2 após a carta magna, as quais foram categóricas em impedir o MP de investigar.
A discussão passa por juízo de igualdade das partes no processo. Há na gênese do processo um princípio denominado paridade de armas, ou seja, as
partes têm de ter igualdade de meios e oportunidades durante o processo. Num processo justo, tanto a defesa quanto a acusação têm as mesmas chances de acusar e defender.
Investigar é produzir provas. Investigar é levantar os dadose informações inerentes a um crime. Se uma das partes do processo (parte acusatória) puder produzir as provas, e a parte ex-adversa (defesa) não tiver essa oportunidade, então quebramos a paridade de armas no processo.
No Brasil, temos a separação da função de investigar (polícia judiciária), que irá produzir as provas a serem levadas à análise do juízo; da função de acusar (Ministério Público); da função de defender (advocacia pública ou privada e a Defensoria Pública); e da função de julgar (magistratura).
Se a parte acusatória for quem produz as provas, logicamente serão produzidas as provas que interessem à acusação, com vistas à condenação. A defesa ficará prejudicada. Quem garante que o órgão acusador (MP) iráse preocupar com as provas de defesa????
A polícia, por sua vez, não é acusação nem defesa. Ela atua numa fase antecedente ao processo (inquérito policial), e produz as provas a serem levadas a juízo, provas a serem contraditadas pela acusação e defesa durante o processo, provas a serem analisadas pelo juiz, dotado de imparcialidade.
Permitir que o MP investigue seria criar uma superposição da acusação em relação à defesa. Seria quebrar a paridade de armas e negar a existência de um processo baseado em princípios democráticos.
Sem dúvida alguma, é importante que o Brasil evolua e atinja um grau de moralidade pública, ninguém é a favor da corrupção, notadamente um delegado de polícia. Todavia, para chegarmos a esse estágio não podemos macular o processo, desrespeitar garantias constitucionais e instalarmos um Estado acusador ou Estado do terror.
Devemos nos lembrar que uma das primeiras preocupações de um regime não democrático é orientar e direcionar o aparelho policial para a acusação. Em sentido contrário, a principal garantia de uma democracia é a separação e o distanciamento da polícia judiciária do órgão acusador. Se tivermos nossas polícias judiciárias servindo aos interesses da acusação, significa dizer que teremos todo o Estado trabalhando para condenar pessoas.
As polícias judiciárias têm a função de esclarecer os fatos. Cabe a elas produzir as provas a serem posteriormente ofertadas às partes (acusação e defesa) a fim de defenderem seus legítimos interesses e ao juízo para que possa prolatar sua decisão final.
Por esse motivo o trabalho da polícia judiciária tem de ser conduzido com isenção e imparcialidade. O Ministério Público é parte do processo. Por isso, é de sua natureza agir com parcialidade. Não cabe a ele produzir provas. É ilegítimo que investigue.
Não podemos nos esquecer de que a grande maioria dos inquéritos serve também para a defesa. É comum ouvir críticas ao inquérito policial dizendo que há um grande número de inquéritos que são arquivados sem denúncia. Essa é a maior prova de que nosso sistema está correto, pois o inquérito policial não se destina a acusar pessoas. A finalidade do inquérito e da polícia judiciária é demonstrar os fatos. O resultado do apurado, investigado e reconstituído poderá ser de que houve ou não crime. A conclusão pode ser que houve um crime, mas em legítima defesa. Ou que o fato aconteceu por um acidente, evento da natureza etc.
A advocacia também se vale dos elementos colhidos e contidos nos inquéritos para formular suas teses de defesa. E como seria um sistema no qual o Ministério Público foi quem investigou e se preocupou em inventariar unicamente as provas de acusação?
Por isso é que tanto a OAB, a Defensoria, a AGU quanto as polícias civil e federal defendem que a investigação seja feita por policiais.
As polícias não são parte no processo. Atuam numa etapa antecedente. Sofrem o controle externo do MP, mas não trabalham para a acusação. Da mesma forma, também estão sujeitos ao controle externo da advocacia, que pode requerer diligências ou acompanhar o feito, ter vistas etc. (Súmula Vinculante nº 14 do STF).
E é justamente por isso que o MP luta, faz algumas décadas, para que a polícia seja subordinada a ele, pois tendo o controle sobre a força de trabalho e os meios de produção (parafraseando Marx), então terá domínio sobre todo o processo, conseguindo o resultado que bem lhe aprouver.
O grande prejudicado com uma eventual autorização constitucional ou legal para que o Ministério Público investigue é justamente o indivíduo. O cidadão é quem sofrerá as consequências. A defesa do cidadão é que ficarásem ter elementos para defendê-lo. No atual sistema, a polícia judiciária coleta todos os elementos e os registra no inquérito policial, o qual pode ser auditado e controlado por acusação e defesa.
Foi justamente nessa orientação ideológica que os parlamentares que participaram da Constituinte de 1988 não permitiram que o MP investigasse. Todavia, o que se tem visto éo MP instaurar procedimentos investigativos sobre os mais diversos argumentos. Nesse afã, o Ministério Público criou uma linha argumentativa de que a Constituição Federal de 1988 lhe outorgaria esse poder. Daía necessidade da PEC 37/11 para reafirmar a intenção do constituinte de separar as funções de Estado e manter o atual processo democrático, respeitando-se a paridade entre acusação e defesa.
Aqui não se trata de falarmos de uma preocupação das polícias judiciárias em defender sua função constitucional, mas de resguardar a higidez das funções de Estado e do sistema processual penal brasileiro. Por todos esses motivos que a PEC 37/11 foi batizada de PEC da Legalidade.
Se não bastassem tais argumentos, gostaria de frisar que, em homenagem ao princípio da eficiência inserido no artigo 37 da Carta Magna, cabe a cada ente estatal desempenhar uma única missão constitucional.
Não há razões plausíveis para dizer que a mesma função caberia a duas ou mais instituições públicas. Isso poderia resultar em retrabalho, ou duplicidade de trabalho com dispêndio de dinheiro público. Por exemplo, a condução da economia cabe ao Ministério da Fazenda. Seria ilógico se o governo resolvesse criar dentro do Ministério da Saúde uma estrutura paralela para estudar a condução da economia nacional. Da mesma forma, seria ilógico termos a polícia judiciária e o MP investigando simultaneamente, sob o pseudoargumento de que, quanto mais gente investigando, melhor para o país. Essa situação anacrônica autorizaria então o país a criar vários exércitos caso entrasse em guerra (pois quanto mais, melhor). O que temos visto na história é que, ainda que estejamos em situações de crise aguda (guerra), não se autoriza duplicidade de funções, mantendo-se um único exército com coordenação única, e sem haver duplicidade de funções.
Ora, a máquina pública é regida pelos princípios da eficiência, economicidade e legalidade. Na situação em tela, teríamos a duplicidade de gastos com o dinheiro público, duplicidade de funções e um resultado pouco eficiente.
Não me parece sensato um sistema que autorize o Ministério Público a usurpar a principal função da polícia judiciária (investigar), que privilegie a acusação em detrimento da defesa e que permita funções sobrepostas gastando em duplicidade o dinheiro público.
Por fim, cabe mencionar que a sociedade brasileira superou com muito custo uma série de momentos históricos sem democracia. Foi com muita dificuldade que consolidamos as balizas do atual processo democrático. Foram superados vários regimes ditatoriais para chegarmos onde estamos. Se começarmos a retroagir as garantias de nosso modelo, então ficará a seguinte pergunta: de quem será a próxima ditadura?
Lourival Mendes é deputado pelo PTdoB do Maranhão. Autor da PEC 37/2011, é delegado de polícia e ex-presidente da Associação dos Delegados de Polícia Civil do Maranhão.

terça-feira, 3 de julho de 2012

Algumas Frases de Einstein

segunda-feira, 18 de junho de 2012

Reflexões

"Todas as coisas são possíveis àqueles que creem."
S. Marcos 11:23